segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

2010 nas últimas

2010 já apodreceu e alguém devia jogar uma pá de cal.

Mas tudo tem um lado bom. Não teremos mais que ouvir os discursos hidrofóbicos de Lula contra a imprensa. Não teremos mais que ver nem ouvir Lula tão cedo.

Já é um bom começo!

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Simplicidade

O fim do ano está aí e eu não tracei nenhum roteiro de viagens, não tenho planos para as férias e sequer sei onde vou passar o Reveillon.

Tudo que eu realmente prefiro é a companhia de alguns bons amigos, em caso de festa.

E mais nada!

terça-feira, 30 de novembro de 2010

Catatônico


Se a última Feira do Livro de São Luís, um tanto careira e mal servida de stands, serviu para alguma coisa foi para que eu adquirisse um exemplar novinho do Catatau, de Paulo Leminski, livro sublime e que estava há muito tempo fora de catálogo (só se encontrava fuçando em sebos e a preços exóticos). O Catatau recentemente ganhou um relançamento pela editora Iluminuras, e é único, hilário, com sua linguagem desafiadora, digna de um Finnegans Wake, de Joyce ou de um Paradiso, de José Lezama Lima.

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Amerika ou o Desaparecido


Lendo e gostando muito de As Brasas, de Sándor Márai. O livro fez muito sucesso nos Estados Unidos, alguns anos depois que o autor cometeu suicídio por lá. São as ironias do Destino, e também as da Literatura.

quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Negra Divindade


Seus Olhos Viam Deus, de Zora Neale Hurston, é um romance cultuado hoje, tanto por ideólogos de raça como de gênero (as feministas o redescobriram e o vêm promovendo desde os anos 70). Parece até, dizendo assim, alguma chatice politicamente correta. Mas o esplendor do livro transcende todas as colorações (políticas ou epiteliais) de seus admiradores.

O entusiasmo crítico que atualmente cerca o livro não foi o mesmo no período em que Hurston o publicou. Malhado pela crítica dos anos 40, especialmente por Richard Wright, o romancista e crítico, que acusou-o de ser "um romance que fazia na literatura o que os artistas brancos faziam, com a cara pintada de negro, no teatro, ou seja, provocar gargalhadas nos brancos". Engajado no realismo socialista, Wright não enxergava nenhum "tema, mensagem nem idéia" em Seus Olhos Viam Deus. Mas ele estava enganado, claro. O livro transborda de temas, mensagens e ideias. A principal é dar voz a personagens exuberantes, plenos, vivos, como Janie Starks e Tea Cake, simplesmente admiráveis e inesquecíveis.

Outro triunfo de Hurston é a linguagem. Ouvidos devem ficar atentos tanto aos delicados timbres da narração poética quanto às falas prosaicas, musicais, de seus personagens. Zora foi filha do prefeito da primeira cidade inteiramente negra dos Estados Unidos, e pode-se dizer que a experiência dela em meio a seus conterrâneos, bem como suas pesquisas sobre folclore e cultura oral dos negros da Flórida como antrópologa, colaboram para erigir as muitas vozes deste arrepiante romance modernista.

Seus Olhos Viam Deus conta a história de Janie, uma jovem e bela mestiça. A avó teme que ela sofra como as mulheres sofriam na escravidão, e aconselha-a a se casar com um homem respeitável, mas que lhe é indiferente. Zora conhece um outro homem, foge com ele, e apesar de enriquecerem ao construir juntos uma cidade negra a partir de uma grande casa à margem da estrada, ela só conhecerá a felicidade - brevemente - ao se unir a Tea Cake, dez anos mais jovem que ela, um homem cuja natureza ambígua e apaixonada a arrasta consigo para uma vida aventurosa nos brejos, até o desfecho quase apocalíptico do livro.

Um romance arrebatador, do princípio ao fim, como poucas obras-primas.

terça-feira, 23 de novembro de 2010

Uma Paixão Literária


A sensação de ler A Paixão (The Passion), ótimo romance pós-moderno da inglesa Jeanette Winterson (fotos), que se passa na Europa durante o período napoleônico, é de perplexidade. O livro é absolutamente imprevisível e conta a estranha relação entre um soldado francês admirador de Bonaparte e uma bela jovem filha de gondoleiro veneziano, com pés disformes (de pato). É um livro de época fantasioso e divertidíssimo, que me lembrou muito o Memorial do Convento, de Saramago, e o Mundo Alucinante, de Reinaldo Arenas. É cheio de histórias absurdinhas às quais o narrador pede que acreditemos ou não. O narrador, por sinal, são dois. O romance muda constantemente de voz, de perspectiva e até de sexo, alguns personagens adoram travestir-se (os protagonistas de Jeanette são sempre andróginos).

Jeanette é uma escritora de destaque, que desafia as convenções literárias, linguísticas e de gênero. A história pessoal dela parece mais uma das muitas narrativas improváveis do seu romance: Jeanette foi adotada por um casal de missionários pentecostais, que a ensinaram a ler através do Deuteronômio. Ainda menina, já se tornara evangelista, escrevendo seus primeiros sermões aos seis anos. Aos dezesseis, fugiu de casa para viver um caso de amor lésbico.

A Paixão foi um livro publicado originalmente em 1987. Serve como uma excelente porta de entrada no universo provocativo da autora. Saiu aqui no Brasil pela Record, em 2008, e a editora promete lançar mais romances dela, como A Guarda do Farol. Que bom!

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

A Visita do Poeta


O poeta gaúcho Fabrício Carpinejar virá a S. Luís participar da 4a edição da Feira do Livro. Carpinejar, um dos mais representativos poetas da atual geração, promete ser o grande destaque do evento que começará a partir desta sexta-feira.

Autor dos premiados livros As Solas do Sol, Biografia de Uma Árvore e Terceira Sede, bem como da ótima compilação Caixa de Sapatos (Cia das Letras), Carpinejar tem um bom blog em que há mais de seis anos divulga suas crônicas, considerações literárias e lançamentos. Curioso? Basta clicar aqui.

quarta-feira, 10 de novembro de 2010


Andei totalmente afastado do blog por ter voltado a pintar (Iniciei uma sequência de cinco telas novas na última semana). Mas nos intervalos longe dos tubos de tinta e antes de dormir, andei lendo bastante. Começando por Caro Michele, da italiana Natalia Ginzburg. Trata-se de uma narrativa epistolar lançada pela Cosac & Naify e integra a maravilhosa coleção Mulheres Modernistas.

Ginzburg é única. Tem um estilo objetivo, vastamente descritivo e sabe dosar suas narrativas com um humor cítrico, azedo a qualquer sentimentalismo barato. Todas as suas histórias envolvem pessoas enfiadas em problemas prosaicos, mas no fundo são elegias, como aqueles dois cintilantes e encantadores contos do livro Família.

Caro Michele
não fica atrás. É uma novela que toca com sutileza em vespeiros variados, como relações entre pessoas de classes sociais diferentes, depressão, tagarelice feminina, homossexualismo. As personagens de Natalia Ginzburg possuem uma ironia afiada, o que torna seus livros mais do que atuais, indispensáveis.

domingo, 24 de outubro de 2010

Traças de Livro e Taças de Vinho


O domingo de calor implacável enfrentei ao pé das estantes, deitado nas cerâmicas do piso, bebendo vinho e ouvindo atentamente a sinfonia de vozes que compõe o monumental painel cubano Três Tristes Tigres, de Guilherme Cabrera Infante (foto).

O livro foi recentemente relançado no Brasil, após anos fora de catálogo. Não é exatamente um romance no sentido tradicional do termo, mas uma coletânea polifônica de contos, situados em uma Havana pré-Fidel que já não existe senão na literatura.

Os ensaios e relatos de Mea Cuba, outro livro repleto de trocadilhos, lembranças e muita, muita ironia fizeram de Cabrera Infante um dos meus herois;

Três Tristes Tigres é uma proeza em prosa, repleto que está de jogos de palavra e de múltiplas surpresas verbais.

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

Presas afiadas


Por que cargas d'água um filme belo e impactante como o sueco Deixa Ela Entrar (Låt den rätte komma in, 2009), de Tomas Alfredson, não passa em nossas salas?

É um enigma. Em compensação, toda e qualquer porcaria americana tem exibição assegurada.

Mas falemos do filme. Numa época em que o tema dos vampiros parecia condenado à banalidade depois das bobagens adolescentes da saga Crepúsculo e de várias séries de TV exóticas e "eróticas", Deixa Ela Entrar, um filme sutil, fascinante - e acima de tudo - perturbador, surge de regiões geladas e sombrias para nos assombrar contando a história de dois pré-adolescentes com sérios problemas pessoais - ele sofre bullyng de meninos da escola e ela é uma vampira.

O filme tem suas ironias e momentos de uma ternura surpreendente. Suas cenas não se ocupam muito em pregar sustos, mas em criar um clima de grande suspense. O que cala fundo é a solidão de seus personagens, traduzindo, em imagens assombrosas, as dificuldades e horrores que implicam a transição da infância para a vida adulta.

Deixa Ela Entrar foi comparado a Nosferatu, obra-prima de Murnau, pelo eloquente crítico de cinema Roger Ebert (assim como Nosferatu, diz Ebert, "este é um filme que leva tão a sério seu tema que parece realmente acreditar que existem vampiros no mundo"). Já foi feita uma refilmagem americana (boa, mas que não se saiu tão bem assim nas bilheterias, embora muito elogiada por público e crítica).

Infelizmente o original sueco e um dos grandes filmes recentes Deixa Ela Entrar ainda não foi lançado em DVD no Brasil. Porque será que eu não me surpreendo?

terça-feira, 19 de outubro de 2010

Guerra de Palavras


Os Cus de Judas, do romancista português António Lobo Antunes é de uma barroquice tortuosa e exuberante, uma construção magistral em prosa poética a ecoar os horrores vívidos experienciados na carne e na alma pelo autor (que serviu como médico em Angola, na Guerra de Ultramar), remetendo ao traumático período colonialista europeu no qual um jovem Lobo Antunes pousava com as tropas lusas em verdadeiros cus de mundo africanos. O livro se ampara nas invencionices narrativas de James Joyce e emprega uma dicção hermética digna de Dylan Thomas.

Como todo alto Modernismo, não é fácil nem óbvio. Mas recompensa enormemente quem ousa mergulhar em suas páginas.

terça-feira, 5 de outubro de 2010

Angústia da Influência


Borges foi um duplo de Kafka. Enclausurado na labiríntica biblioteca do seu avô, o menino Jorge Luis deve ter sobrevivido ingerindo as páginas das enciclopédias.

****

O mais belo de todos os livros a enveredar pela linhagem fantástica de Kafka e Borges é Paisagem Pintada Com Chá, de Milorad Pavitch.

sábado, 25 de setembro de 2010

Que Mário?

Como é saudável a obra de nossos primeiros modernistas. O coloquialismo saboroso das Crônicas de Belazarte, de Mário de Andrade, não datou, diferente do concretismo vanguardeiro dos irmãos Campos. Oswald de Andrade é inteiramente admirável. Uma biografia da bela Tarsila do Amaral me traz de volta a fina ironia da "paulicéia desvairada" dos anos 20. Nestes tempos culturalmente áridos, de pop niilista pregando um vazio estilístico como mote único, estamos carentes de inovações inteligentes e bem-humoradas.

Bomba! Bomba! Bomba!


A bomba "Lula: O Filho do Brasil" foi selecionada por um júri oficial para representar o Brasil na disputa pelo Oscar. Uma escolha um tanto duvidosa, não apenas por motivos estéticos, mas porque este é um ano de disputa eleitoral, em que Lula se projeta na campanha de sua candidata como se candidato fosse.

Os cineastas que votaram por unanimidade no filme alegam que não teriam "intenções políticas" ao fazerem a escolha, é o que sugere o Ministério da Cultura, enquanto comemora a decisão "imparcial" dos tais sujeitos. Querem nos convencer que Lula é um personagem forte, internacional, que pode comover a Academia. Convém lembrar que mesmo com 80% de apoio popular ao presidente, além de uma gigantesca propaganda oficial e uma farta distribuição em salas de cinema, "O Filho do Brasil" foi relegado às baratas por aqui, arrecadando uma pífia bilheteria.

Além do mais, Lula é um notório pé-frio. Todos os personagens fortes do seu governo - exceto madame Dilma - caíram após denúncias, mensalões e outros escândalos. Sobrou azar até para o diretor da sua cinebiografia edulcorada, que está atualmente em coma. "O Filho do Brasil" é uma escolha no mínimo conveniente para cineastas que dependem do financiamento oficial para realizarem bombas que afastam o público, mas que rendem prestígio e dinheiro de financiamento a seus realizadores.

sexta-feira, 24 de setembro de 2010

Vulgaridades


Eleições aqui no Maranhão me lembram aquela piada suja que alguém conta numa mesa de bar e da qual ninguém ri, mas todo mundo fica sorrindinho amarelo, de tanto constrangimento.

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Senta que lá vem história


Primeiro uma bronca: Atualmente não tem um único filme que preste em cartaz nas salas de cinema de SL. Só o pioral. Não é à toa que espero ansiosamente pelo novo filme de Tarsem Singh (foto), o diretor das maravilhas contemporâneas Dublê de Anjo (The Fall) e A Cela (aquele em que a a popozuda Jennifer Lopez mergulhava virtualmente no estranho imaginário de um serial killer).

Dublê de Anjo, um cult total, talvez seja o filme mais lindo, plasticamente falando, que já vi na vida, e ainda contava uma bela história. A alta qualidade dos trabalhos anteriores do diretor indiano justificam a grande expectativa criada agora em torno de Immortals, o novo projeto de Tarsem, que deve estrear por aqui (se os deuses do cinema conspirarem a favor) na segunda metade de 2011. Crianças, não morram até lá.

Um fragmento bem hard do novo filme:

terça-feira, 21 de setembro de 2010

Tributo

Aqui vai uma cena da comédia francesa "Gainsbourg" (ainda inédita no Brasil) que conta com uma participação especial e bem divertida do cineasta Claude Chabrol nums de suas últimas aparições no cinema. Ele interpreta um chefão de gravadora e o detalhe são as caras e bocas que faz quando Serge Gainsbourg e Jane Birkin lhe apresentam o hit erótico e escandaloso "Je T'Aime Moi Non Plus".

domingo, 12 de setembro de 2010

Cinema

Nunca mais veremos um novo filme de Claude Chabrol, o diretor francês do magnífico O Açougueiro (foto), um dos maiores suspenses psicológicos de todos os tempos (digno do melhor Hitchcock, de quem Chabrol era um discípulo aplicado).

sábado, 11 de setembro de 2010

Poesia brasileira contemporânea?


Sempre achei um saco a poesia de Nelson Ascher e de Armando Freitas Filho. Ascher não tem a menor noção de ritmo e sequer uma dicção decente, e como todo aedo formalista é um sub-sub-Cabral. Freitas Filho é um poeta? Me soa mais como um prosador que por acaso escreve versos.

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Mas ainda tem pior: a transvanguarda pós-concretista, absolutamente ilegível.

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Outra praga é o poeta-letrista de MPB. Figurinhas prestigiadas do pop que se lançam na seara da poesia. Um dia ainda veremos rappers na Academia Brasileira de Letras.

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Exceções sempre há, como os Nejar, pai, filho e mãe. E Antonio Cícero, Nauro Machado, Ferreira Gullar. Dos novos novíssimos dá para pinçar um ou outro nome, mas em geral os esqueço.

Obs: Em Portugal, berçário da língua, tem coisas bem mais relevantes nascendo agora mesmo.

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Mea Culpa

A minha falta de memória em relação a assuntos mundanos vive me levando a cometer gafes desastradas!

Uma solução seria encaixar a vida em agendinhas. Mas...

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Rol


O Listal é um site muito divertido para os que, como eu, compartilham a estranha mania de elaborar listas de melhores isso ou aquilo (mania que o escritor inglês Nick Hornby parodiava com muita graça em seu romance Alta Fidelidade).

Já comecei a elencar meus livros e filmes favoritos por lá. Mas estou só no comecinho. Serve ao menos para matar o tempo antes que o tempo nos mate.

quinta-feira, 26 de agosto de 2010

O calor


Aluísio Azevedo principiava O Mulato descrevendo o calor escaldante, insuportável, de São Luís. É exato, preciso: a melhor descrição já feita sobre a região. Basta descer de avião por aqui para ter a sensação de mergulhar numa labareda ardente. O clima do Maranhão não muda, é permanentemente infernal. Talvez por isso não passemos de pobres diabos, comandados há mais de quarenta anos pelo mesmo e velho coisa ruim.

segunda-feira, 23 de agosto de 2010

Pilantragem ocidental


Entre os candidatos às eleições 2010 aqui no Maranhão, tem um maroto (não vou divulgar o nome) que faz campanha usando "Wild World" (de Cat Stevens) como jingle. Virou um reggae bem chiclete. Se Yusuf Islam (o cantor mudou de nome depois de converter-se ao islamismo) ouvisse o troço, seria capaz de processo. Islam renegou todos os seus sucessos dos anos 70 e não permite que eles toquem sequer na televisão em forma de trilha de comerciais.

Felizmente não transformaram a lindíssima "Morning Has Broken" em Vote no Candidato Fulano de Tal. Ainda.

Ousadias na telona


Serge Gainsbourg (1928 - 1991), foi um músico extraordinário, que ficou famoso por suas muitas excentricidades.

Na capa do disco Love On The Beat (foto) ele aparecia maquiado como um travesti. Serge sempre gostou de se divertir tirando onda dos tabus sexuais alheios.

Feio, baixinho, narigudo e orelhudo - ainda assim ele se envolveu com beldades como Jane Birkin, Juliette Gréco e Brigite Bardot. Sedutor extremista, Gainsbourg era um misógino obcecado por sexo e um bêbado constante. Sua vida e sua carreira foram marcadas pela audácia, pela provocação. Sua música mais famosa, "Je T'aime Moi Non Plus", (composta para Bardot) simulava o êxtase de um orgasmo feminino, já em "Lemon Incest" ele posava de pai incestuoso ao lado da filha Charlotte, hoje também cantora cultuada.

Gainsbourg virou filme. Na França, já foi assistido por mais de um milhão de pessoas e vendeu 150 mil DVDs . A diretora, Joann Safar, não define seu filme como uma cinebiografia, mas como uma comédia musical ao estilo de "Todos Dizem Eu Te Amo" (de Woody Allen) ou de "Sinfonia em Paris" (de Vincent Minelli). "Gainsbourg", infelizmente, ainda não tem previsão de lançamento por aqui.

quarta-feira, 18 de agosto de 2010

Brinquedo de Gente Grande

O Pato Fu amadureceu. E como todo grupo que se preze enfrentou o desafio pop de elaborar um "álbum conceitual."Música de Brinquedo, o novo disco, foi - de fato - todo gravado com instrumentos musicais de brinquedo. O repertório escolhido é uma seleção de músicas que influenciaram o Pato Fu. Vai de Paralamas a Paul McCartney, passando por Zé Ramalho e Temptations.

Algumas crianças (de verdade) fazem backings e soam um bocado marotas se comparadas à timida voz de Fernanda Takai. O resultado final é divertido, ainda que lembre (um pouco) aqueles trabalhos experimentais da Björk, como "Vespertine" ou "Medula", mas sem o lado esquisitão destes discos. O Pato Fu experimenta, mas brincando, criando arranjos ora delicados ora engraçados.

As versões são muito legais, mas eu destaco "Rock and Roll Lullaby" (B. J. Thomas), "Ovelha Negra" (Rita Lee) e "Sonífera Ilha" (Titãs). Música de brinquedo soa como um papo muito sério, coisa de quem busca se reinventar. Com este disco o Pato Fu comprova - assim como Adriana Partimpim - que a boa música é para crianças de todas as idades.

terça-feira, 17 de agosto de 2010

Cena de Cinema


Em Adúltera (Le Diable au Corps, 1947), adaptação para o cinema de O Diabo no Corpo, o escandaloso primeiro romance do enfant terrible Raymond Radiguet (desenhado aqui por seu amante Jean Cocteau), há a cena, divertidíssima, do vinho estragado no restaurante, que é perfeita por sua ironia e maldade aliciadora: é um momento que nos faz apreciar a cara de pau dos jovens protagonistas e que estabelece a ousada cumplicidade amorosa do casal.

quinta-feira, 12 de agosto de 2010

O Único Romance de Canetti


Nos últimos dias tenho me dedicado à leitura de Auto-de-Fé, o primeiro e único romance de Elias Canetti, tijolaço que é considerado por muita gente boa um dos melhores romances do século vinte.

O livro, a meu ver, está longe de ser a obra-prima de Canetti. O genial Massa e Poder leva o prêmio. Mas Auto-de-fé tem seus momentos: é um livro que prende a atenção. O grande pecado do livro são os seus protagonistas - completamente caricaturais, ilógicos, às vezes tão patetas quanto personagens de historinhas em quadrinhos.

A história seria cômica, não fosse trágica: um intelectual alienado obcecado por livros que se casa com uma faxineira vulgar. Tudo em tom de farsa, baixa farsa, e que deve terminar muito mal, creio eu. O livro não dá sono. Mas Canetti tem coisas melhores.

segunda-feira, 9 de agosto de 2010

Filme Sonhado


A Origem (Inception, 2010), de Christopher Nolan, é um filme que confundiu as cucas dos diversos casais-balde-de-pipoca presentes à sessão, que ficavam fazendo cara de ponto de interrogação, obviamente sem entender a "lógica" de um filme que segue a lógica (e o absurdo) dos sonhos.

Quem não entende um filme desses vai ver é surdo. O filme chega a ser tão explicativo sobre seu próprio modus operandi que chega até a ser meio cansativo. Mas o público de cinema hoje em dia anda tão viciado em clichês que se um filme comete a ousadia de falar da arquitetura de sonhos ou se nos oferece várias camadas sobrepostas de realidade e imaginário (algo que, no fundo, todo filme faz) fica parecendo muito complicado, ou supremo pecado: "cabeça" demais.

A Origem é puro entretenimento, mas também funciona como um labirinto complexo: mergulhar nele equivale a uma experiência desconcertante e desorientadora. Emergi da sala com uma sensação maravilhosa, um misto de perplexidade sensorial e de deslumbramento visual.

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

Hiper Super

Sem querer fazer propaganda, mas já fazendo: no Hiper mercado, no São Luís Shopping, há uma mesa repleta de livros a precinhos bem inhos. Lá, no meio de vários livros da Coleção Ponte Velha, da editora Escrituras, que lança autores portugueses contemporâneos no Brasil encontram-se vários exemplares do magnífico Animal Olhar, de António Ramos Rosa (um dos mais geniais e consagrados poetas da atualidade) e o surpreendente A Idade da Escrita, da Ana Hatherly (que além de poetisa é romancista, ensaísta, tradutora e artista plástica), sem falar da esplêndida coletânea coletiva de poesia neo-barroca Jardim de Camaleões, cada um pela bagatela de 4,90 dinheiros. Já o irônico romance A Saga dos Marx, de Juan Goytisolo (autor recomendado pelo eminente Harold Bloom em O Canône Ocidental) eu catei por lá por apenas 2,90. Meus amigos, corram.

domingo, 1 de agosto de 2010

Foi Show

Ontem, duas sereias apresentaram-se no Teatro João do Vale. Ceumar (foto) era a atração principal e o cristal de sua voz cintilou para o público, que aplaudia com vigor e muitas vezes cantava junto. Mas a revelação da noite, pelo menos para mim, foi a cantora maranhense Tássia Campos. Ela tem uma postura bem tímida no palco. Mas que voz. Que repertório. Que grata surpresa. Fiquei muito entusiasmado e mais ainda quando informaram que ela está gravando o primeiro disco. Convidada para voltar ao palco para o encerramento do show, Tássia juntou-se a Ceumar e ambas foram aplaudidas de pé.

Outra alegria musical da noite foi descobrir que também teremos shows este ano de Mariana Aydar, Céu e Fernanda Takai. Enfim, aplaudamos o jornalista Gilberto Mineiro pela iniciativa de trazer estas cantoras e por incentivar os novos talentos locais.

Parece que SL finalmente começa a se curar da obsessão pornô-infantil do forró cearense e volta a ouvir boa música pelo simples e enorme prazer que dá aos ouvidos, aos pés e à alma.

terça-feira, 27 de julho de 2010

Covers

Versão classuda dos Scissor Sisters para um clássico do Roxy Music. Os Sisters, de disco novo na praça, estão muito divertidos.

3D não vale o ingresso


Preciso confessar: ver filmes em 3D para mim é um baita programa de índio, com cocar de penas e tudo. Não pelo formato em si. É uma experiência até curiosa ver todos aqueles troços voando na direção da gente ( fico imaginando como deva ser um filme pornô em 3D). Mas é coisa para criançada, não para cinéfilos consumados, pois guris devem achar o 3D uma cruza perfeita entre o game, a pipoca e o cinema.

Mas eu não sou guri desde os anos 70, e aqueles óculos pesados, incômodos, nunca mais. Da última vez que os usei, senti o meu nariz inchar como se tivesse levado um soco e vi estrelinhas roxas rodopiarem acima de minha cabeça e cheguei a erguer as mãos para tentar tocá-las, pensando que eram um efeito do 3D. Era a dor. As cores dos filmes também sofrem: ficam desbotadas, empasteladas, monocórdias. O tal sistema 3D ainda tem muito o que melhorar, isso sim.

segunda-feira, 26 de julho de 2010

Sem Máscaras


Acabei de ler O Náufrago, do Thomas Bernhard, e emendei com a leitura de Perturbação. O negativismo e a ironia depreciativa contra tudo e todos são as marcas de Bernhard, assim como de Beckett, Miller e Céline, autores que tratam da doença, da agonia e da morte da sociedade contemporânea, que apontam o definhamento e o apodrecimento de todos os valores da nossa civilização. São os artistas do desmascaramento. Felizmente partilham um humor amargo e venenoso, que transformam suas obras em comédias sombrias e nos permitem alívio cômico. Com eles aprendemos a rir de nossos próprios demônios.

sexta-feira, 16 de julho de 2010



Um escritor de primeira grandeza que tem norteado a maior parte das minhas preferências (ou aversões) literárias, ultimamente, é Samuel Beckett. Admiro o lado dramaturgo (pelo qual ele é mais reconhecido), mas amo principalmente os romances que compõem a trilogia Molloy, Malone Morre e O Inominável.

Não escrevo isso aqui para rasgar seda como fez (o recentemente falecido) Harold Pinter, que uma vez taxou de "linda" a obra de Beckett. Nem levo muito a sério o que escreve como crítico Ferreira Gullar, que considera a obra de Beckett uma chatice só. Tem muita gente boa e culta que acha Gullar um chato. Eu admiro tanto Beckett romancista quanto Gullar poeta, vai ver porque sou muito chato também. O que pretendo, creio, é fazer um justo reconhecimento:

O Inominável supera tudo que eu estava lendo antes e tudo que vim a ler depois. É duro. Uma pedrada. Um desafio. Uma obra-prima. E como tal, uma monstruosidade.

Dá para sentir a influência de Beckett em escritores brasileiros contemporâneos, como Bernardo Carvalho, por exemplo. Seu romance Teatro é puro Molloy. Com seus dois personagens que no fim das contas são um só.

O tão falado "desespero existencialista" que muita gente insiste em enxergar em Beckett é coisa de quem não percebe o sinistro humor de seus escritos. Isso de que a obra dele é vazia e fica falando e falando sobre o "nada" é um lugar-comum de leitores vazios, que não têm nada a comentar. Eu diria que o negativo da obra de Kafka faz eco na obra de Beckett, que recorre a uma poesia áspera (e o naturalismo de Joyce foi capital para desenvolver esse jeito rude de escrever, com uma diferença: Beckett não recorre às epifanias verbais de Joyce). Ele foi brilhante em sua monografia sobre Marcel proust, ao ver na Busca do Tempo Perdido os limites da arte ficcional. Há um emaranhado entre Proust, Kafka e Joyce, nas obras de Beckett. Suas personagens estão num limbo temporal, como os personagens de Kafka, e lembram para a frente como o narrador proustiano.

Ninguém, nem mesmo os imitadores que povoam o inferno dos bem-intencionados, superam o exercício de prosa poética de Beckett, no limite entre silêncio e palavra, em seu pleno reconhecimento do descrédito da linguagem. Beckett é um poeta que lendo Proust, Kafka e Joyce, fez um emparelhamento destes em suas próprias obras, soando totalmente original. Para se distanciar do estilo de Joyce, por exemplo, ele passaria a escrever em francês.

Mas Beckett não é figurinha fácil. Modernista por excelência, criou um caminho absolutamente único na literatura pelo qual não dá para seguir adiante sem se perder na ilegibilidade.

P.S.: Temos, no Brasil, um escritor também genial que ombreia com ele, ao se enveredar por uma via pessoal, solipsista, negativa e ambígua pelo âmbito da linguagem, e é Clarice Lispector.

quarta-feira, 14 de julho de 2010

Apontamentos para um ensaio futuro


Um ensaio não muito longo, espero, sobre o eterno adolescente, idéia que me parece cabível como reflexão sobre as mentalidades da nossa predominante cultura de entretenimento:


- Rever os filmes “Little Children”, com Kate Winslet e Juventude Transviada, com James Dean.


- Reler Rimbaud (há uma biografia recente, de Edmund White, que já encomendei) e também Radiguet, procurar um ensaio de Camile Paglia (sobre a sem-gracice dos efebos, mas ao mesmo tempo seu reconhecimento de que a adolescência é o único momento em que o homem se vê livre da autoridade feminina representada pelas figuras da mãe e da esposa);


- Contrapor isso a Machado de Assis (em Memórias Póstumas de Brás Cubas, o narrador já se sente homem feito quando lhe nascem os primeiros tufos de bigode: no séc. XIX o homem emergia da infância diretamente para a chamada vida adulta, pois naquela sociedade patriarcal o desejado era se tornar logo um homem adulto, um senhor de posses e de escravos. A hoje tão superestimada adolescência e o desejo de ser o eterno adolescente sequer existiam) o que me leva a perguntar: esse fascínio todo pelo “adolescente” é um fenômeno recente, do final do século XX e na totalidade deste séc. XXI?


- E o Romantismo (Goethe, Werther, Tristão e Isolda)?


- E Shakespeare (Romeu e Julieta)?


- O conceito de "fim da infância". Reler o poema homônimo de Montale.


- Carlos Drummond de Andrade em "O Observador no Escritório" dizia que em nossos dias não havia mais crianças porque a televisão conferia maturidade a todas;


- Reler o conto fantástico "Teleco, o Coelhinho", de Murilo Rubião, como uma alegoria da caótica (e breve) liberdade da juventude.

quinta-feira, 8 de julho de 2010

Um Gênio Sombrio e Iluminado


Livrinho fascinante é este O Mundo Prodigioso que Tenho Na Cabeça, um ensaio biográfico de Franz Kafka, escrito pelo americano Louis Begley. A frase que deu título ao precioso ensaio é do próprio Kafka.

O livro reúne informações importantes sobre o autor e a cidade de Praga, seu círculo íntimo, suas relações com a família e no ambiente de trabalho, mas vai muito além: tenta traçar um perfil psicológico de Kafka, baseado em seus escritos íntimos, diários e cartas, e também na opinião daqueles que o conheceram, mais ou menos como se Begley tentasse sondar o que ia pela cabeça de um dos mais geniais escritores de todos os tempos, uma tarefa no mínimo ambígua, em se tratando de um escritor que cunhava aforismos como "psicologia nunca mais" e que desdenhava de Freud, considerando-o um mero compilador das "ansiedades judaicas".

Mas esta ousada proposta de Louis Begley não apela ao jargão psicanalítico, nem resvala para uma caricatura do autor de "A Metamorfose": trata-se um ensaio acurado, brilhantemente escrito, que ilumina ainda mais o gênio e o espírito criativo de Kafka (um autor que dizia escrever para retratar suas paisagens oníricas e que, abominando família e emprego, desejava devotar-se exclusivamente à sua vocação literária). Neste ensaio, Kafka transparece, página após página, graças à transcrição de suas próprias e agudas palavras, ilustrando os fatos de sua vida. Um livro no mínimo indispensável.

segunda-feira, 5 de julho de 2010

5 Livros Que Me Fizeram Dormir


Os livros a seguir têm uma peculiaridade em comum: caíram das minhas mãos e fatalmente me fizeram dormir durante a sua leitura. Mas isso não quer dizer que eu não tentarei lê-los novamente, devo recorrer aos ditos cujos numa dessas noites de insônia:

01. Cem Anos de Solidão, de Gabriel Garcia Marquez (esse provou-se muito eficaz, mal comecei a ler a saga dos Buendias e fui afundando gradativamente entre os lençóis e ressonando com cada vez mais vigor. Cem Anos é um verdadeiro Lexotan literário). Cotação: quatro roncos sonoros.

02. O Arco-Íris da Gravidade, de Thomas Pynchon (os olhos foram fechando aos poucos, ficando mais pesados, então mergulhei num sono difícil de ser perturbado). Cotação: duas roncadelas e uma babadinha no travesseiro.

03. Os Buddenbrook, de Thomas Mann (o livro de estreia deste grande autor me fez dormir bonito). Cotação: dois bocejos

04. O Código da Vinci (um primeiro capítulo terrível, que me nocauteou sem piedade). Cotação: Um estado de coma profundo

05. O Jogo da Amarelinha, de Julio Cortázar (é um ultraje dizer isso de um dos livros mais elogiados do século XX, de um autor que admiro tanto - especialmente os contos - mas, o fato é, que deu sono. Cabeceei de um lado pro outro, cambaleei miseravelmente, até que caí sem salvação nos braços de Morfeu) Cotação: uma canção de ninar.

terça-feira, 29 de junho de 2010

Meu Primeiro Romance


Vou tocando meu livro. Seu título definitivo é"Um Salto no Vazio" e trata sobre um suicídio (talvez dois) e suas consequências lógicas (ou irracionais?), afetando a vida alheia (a morte alheia?). Escrevo frases à base de paradoxos, ironia atrás de ironia. Não pretendo contar histórias no sentido clássico. Mas enfiar num beco sem saída a tal da arte narrativa.

Paradoxo

As imagens que restam do inacabado "Inferno", de Henri-Georges Clouzot, são paradisíacas. Confiram:

sexta-feira, 18 de junho de 2010

Funeral Blues


Faz um dia cinzento, nublado. Saramago está morto, leio na web. A nossa é uma época em que já não somos postos a pensar, afirmava. Mas eu paro e penso por um minuto (ou mais) no autor de O Ano da morte de Ricardo Reis, As Intermitências da Morte e do Memorial do Convento. Não somos postos a ler, ele poderia ter dito ainda. Contruiu uma obra tentando suplantar os contrasensos e cegueiras da vida moderna, afirmando a dignidade da língua portuguesa e do amor, posto muitos metros acima das vitórias da morte. Em terra de cegos, foi rei.

quarta-feira, 9 de junho de 2010

Constatação


Fui à loja da Oi para cancelar o meu Velox 3G após o período de "degustação" gratuita. Estava insatisfeito com as cobranças indevidas que tentaram me inpingir a cada mês, de serviços que supostamente eu teria solicitado à Oi. O atendente foi logo me dizendo que lá na loja eles não faziam cancelamentos, só adesões. Se eu quisesse, devia telefonar para a Oi (passei a manhã inteira tentando fazer isso, em vão).

Geralmente sou muito calmo, mas certas horas baixa um erê em mim. Creio que para ser atendido ou entendido pelas pessoas precisamos dar uma de louco. Minha insanidade é muito contida, mas inequívoca. Faço expressão de saco cheio e solto um "Não, obrigado!" que diz tudo. Acabei conseguindo o cancelamento.

Ah, as empresas que "fornecem" banda larga no Brasil! Até quando seremos acorrentados a elas, a seus preços escorchantes que passam por promocionais e a seus atendimentos no mínimo duvidosos aos clientes?

domingo, 6 de junho de 2010

Releituras

Aproveitei os poucos momentos livres do fim-de-semana para reler o único livro do escritor suíço Robert Walser lançado no Brasil, o romance O Ajudante, publicado pela Arx.

Walser é um frasista nato. Sua tiradas são concisas, brilhantes e altamente citáveis. O Ajudante é Joseph, um jovem que vai trabalhar na mansão dos Tobler.

O sr. Tobler é um inventor casado, com quatro filhos, vivendo no quadro privilegiado de uma família burguesa. Joseph é um curioso observador dessa família. Ele acompanha a desagregação material, as negligências morais (e a loucura insidiosa) dessa família. Nota o comportamento afetado e a injustiça familiar da mãe, a sra. Tobler, que trata com frieza uma criança que não lhe desperta amor, deixando-a sob os cuidados ( ou melhor dizer) sob a tortura diária de uma criada brutal.

Há um quê de autobiográfico no relato todo. Walser trabalhou como um "ajudante" em condições similares. O patriarca Tobler me faz pensar no pai do escritor, que se suicidou após ter falido. A mãe do escritor logo em seguida adoeceu (de esquizofrenia).

Como romancista, Walser notabilizou-se por não reescrever nada. O texto final era exatamente aquilo que ele escrevia à medida que as ideias iam surgindo. E que ideias!

Os outros romances de Walser, dentre eles a obra-prima Jacob Von Gunten, permanecem inéditos entre nós. Por que cargas d'água eu não sei. Dá uma vontade danada de sair e reclamar por aí.

terça-feira, 1 de junho de 2010

Poesia e Loucura


O poeta italiano Dino Campana publicou apenas um livro em vida, o singularíssimo Cantos Órficos, lançado aqui no ano passado pela editora Martins Fontes, numa edição bilíngue, acrescida de outros poemas e por fragmentos esparsos.

O poeta foi - desde os quinze anos - acometido pela loucura que o acompanharia até sua morte em 1932. Viajou por todos os cantos da Europa e esteve internado em muitos hospitais psiquiátricos.

Sua poesia é musical, simbolista, evocativa, fragmentada, com fortes laivos místicos. Mas dizer isso não a esclarece. É enigmática, porque oferece doces e frescas lembranças (para nós obscuras) e vasculha até o fundo da memória - para resgatar a beleza dos instantes, fugidios como os dias. Há belas passagens que me fazem pensar no Impressionismo e em Proust. E há alucinações inesperadas como aquelas de Walser, autor admirável como Campana, que também permaneceu internado em um hospital psiquiátrico até o fim dos seus dias.

quinta-feira, 20 de maio de 2010

Grandes roubos


Leio que a tela Pastoral (1905), de Matisse (foto acima), foi roubada de um museu de arte moderna da França, junto com outros cinco quadros de grandes mestres como Picasso, Braque e Modigliani.

Lembro-me até hoje do impacto que esse quadro (e as outras obras iniciais de Matisse) tiveram sobre mim, despertando-me para um novo senso estético, baseado na explosão e na beleza das cores, na simplicidade das formas, na inquietação e na liberdade criadoras.

As câmeras do museu captaram um misterioso sujeito mascarado removendo as telas com um estilete. Quem dera fosse eu, não pelos milhões de euros em jogo, afinal tratam-se de obras famosíssimas, ou seja, invendáveis - mas pelo puro e simples deleite dos meus olhos.

segunda-feira, 17 de maio de 2010

Fanatismo


Ernesto Sábato tem razão. Para se tornar um romancista é preciso fanatismo. Respirar literatura, comer literatura, sonhar literatura. Ao ponto de explodir como Henry Miller, gritando: "À merda com a literatura!"

segunda-feira, 10 de maio de 2010

acachapante


Um belo livro esperando releitura em minha cabeceira é o intrigante Chapadão do Bugre, obra-prima de Mário Palmério, que consumiu muitos anos de pesquisas linguísticas do autor. Palmério empregava um riquíssimo vocabulário regionalista, que só encontra um rival à altura em nossa língua: Guimarães Rosa (Palmério leva a vantagem de não ser tão barroco quanto Rosa) para contar uma versão muito particular de uma história real ocorrida nos confins de Minas no início do século passado. Clássico, obrigatório, inesquecível.

sábado, 8 de maio de 2010

Dois livros


Livrinhos quentes são os do dominicano-americano Junot Diaz (foto), graças aos céus lançados no Brasil pela editora Record: o impressionante Afogado (coletânea de contos) e o magnífico romance A Vida Breve de Oscar Wao, um dos livros mais divertidos que já pude ler (às vezes chorando de tanto rir), que Diaz, perfeccionista, levou uns dez anos escrevendo e que acabou faturando o Prêmio Pulitzer.

"Que importância têm as vidas breves e anônimas... para Galactus?", é a frase extraída dos quadrinhos do Quarteto Fantástico, que encaixa como uma luva ao servir de epígrafe desse retrato farsesco de um nerd dominicano, obcecado por cultura pop, cuja família expatriada aprende na pele (e na alma) as consequências nefastas de ter vivido sob o tacão de um ditador, Rafael Trujillo.

Wao é uma obra-prima inigualável. São 332 memoráveis páginas que eu devorei numa noite e meia.

sexta-feira, 23 de abril de 2010

Hoje é a estreia nacional de A Estrada, filme estrelado por Viggo Mortensen, que também conta com a bela e talentosa Charlize Theron. O filme é uma adaptação do apocalíptico romance homônimo de Cormac McCarthy, eleito pelos críticos americanos como o melhor livro da década passada.

Não é a primeira adaptação de um romance do sublime McCarthy para as telonas: O oscarizado "Onde os Fracos Não Tem Vez", dos irmãos Coen, e "Espírito Selvagem", de Robert Redford, são outras ótimas adaptações de obras suas.

Os livros de McCarthy têm sido regularmente lançados no Brasil, pela Companhia das Letras e agora pela editora Alfaguara. Particularmente, não gostei muito da tradução de Meridiano de Sangue pela Alfaguara. Explico-me. Há uma tradução mais antiga, da Nova Fronteira, se não me engano, que era bem superior. Logo na primeira linha, na primeira página, Cormac nos apresenta o seu protagonista, "The Kid". A versão da Nova Fronteira traduzia essa apresentação assim: "Eis o Garoto". Já a Alfaguara preferiu: Eis a "Criança". Putz. Traduzir The Kid como a "Criança": é fogo! Antipatizei de cara.

No entanto, recomendo o livro mesmo assim. Meridiano de Sangue é o melhor romance que já li publicado em décadas. Quando - todo entusiamado - emprestei o meu exemplar para o (escritor e jornalista) Mayron Régis, que nunca tinha lido McCarthy, ele nem deu muita bola, como sempre faz. mas um dia, depois de algum tempo, ele leu a coisa toda de uma só sentada. Foi absorvido pela leitura. Ficou perplexo com a personagem do Juiz. Quando me devolveu o livro, disse-me que "Meridiano" foi uma das maiores experiências literárias de sua vida.

Hoje, Mayron já leu tudo que foi publicado no Brasil e é um dos maiores aficcionados em Cormac McCarthy que eu conheço.

O romance A Estrada é também sublime. O que me leva a concluir que não há páreo na literatura contemporânea atual para grandeza de McCarthy.

segunda-feira, 19 de abril de 2010


Fico perplexo quando Elias Cannetti comenta, em um de seus ensaios, quão admirável lhe parecia a vida de Tolstói - sobretudo os anos finais, em que o grande escritor russo se transformou numa espécie de Rei Lear à própria revelia - e quão pouco apreço sentia pela obra tolstoiana.

Tolstói é tão grandioso que comove os chamados grandes leitores. Ao falar em seu nome lembro-me de um dos maiores leitores que já conheci, o meu saudoso amigo João de Paula Aragão, com quem, de literatura tudo que pude debati, e que uma vez, convidado por mim a falar sobre "o maior romancista que já havia lido" , citou-me o Tolstói de "Guerra e paz", enquanto eu pensava no Proust de "Em Busca do Tempo Perdido".

Adquiri recentemente, pela Cosac & Naify, a bela edição do Khadji-Murat, novela final de Tolstói, considerada por Harold Bloom, sua obra máxima. É um estilo cinematográfico. Tostói carregava o manuscrito consigo por onde ia, sempre fazendo modificações, suprimindo trechos belíssimos, a despeito da opinião de seus admiradores. Para o último Tostói, escrever era cada vez mais a arte de eliminar palavras. O texto que nos chega atinge os limites da transparência.

quinta-feira, 15 de abril de 2010

Paixões


Rever em DVD o esplêndido Louca Paixão (1973), de Paul Verhoeven, dá um puta tesão revigorante. Eis um filme visceral, anárquico, libertário, desagregador das mesquinhas convenções sociais. A paixão sexual raras vezes foi retratada com tamanha fúria do corpo e da alma.

Uma curiosidade: turkish delight, o título original deste grande filme holandês lançado no Brasil como Louca Paixão, é o nome do simpático docinho da foto (que aparece no filme numa cena pra lá de dolorosa).

Já a grande paixão da minha vida atual tem as seguintes características físicas: Tela LCD, FullHD, 42'' e Som Surround.

quarta-feira, 14 de abril de 2010

Desenhos para Memela

Memela (Mirela), minha sobrinha que está para completar dois anos sempre que vai à casa dos vôs me pega pela mãozinha e me traz para a frente do computador.

É que no paint brush tenho me especializado em fazer desenhos bem coloridos para ela.
Aqui vão alguns: